RECOMENDAÇÃO Nº 007/2014-PmJA
O Ministério
Público do Estado do Rio Grande
do Norte,
através da Promotora de Justiça signatária, no uso das atribuições que lhe são
conferidas pelos artigos 129, inciso IX, da Constituição Federal de 1988,
artigo 6º, inciso XX da Lei Complementar Federal nº 75/93, bem como pelo artigo
201, inciso VIII e §§ 2º e 5º, alínea “c”, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da
Criança e do Adolescente),
CONSIDERANDO que, nos termos do art. 201, inciso VIII, da
Lei nº 8.069/90, compete ao Ministério Público “zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados
a crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais
cabíveis”;
CONSIDERANDO que por ocasião do Carnaval são realizados
inúmeros bailes e celebrações diversas, onde é comum a prática de excessos
decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas, assim como atos de violência;
CONSIDERANDO que, na perspectiva de evitar a exposição de
crianças e adolescentes a tais situações, o art. 149, da Lei nº 8.069/90,
conferiu à autoridade judiciária a competência de regulamentar, por meio de
portaria, o acesso e a permanência de crianças e adolescentes desacompanhados
de seus pais ou responsável em “bailes ou
promoções dançantes” e em “boate ou
congênere” (cf. art. 149, inciso I, alíneas “b” e “c” do citado Diploma
Legal);
CONSIDERANDO que, nesta Comarca, já foi expedida uma
Portaria Judicial disciplinando o acesso e permanência de crianças e
adolescentes desacompanhados dos pais aos bailes de Carnaval, cabendo aos
proprietários dos estabelecimentos onde serão estes realizados e/ou
responsáveis pelos eventos respectivos, por si ou por intermédio de seus
prepostos, o rigoroso controle de acesso aos locais de diversão, de modo a não
permitir o acesso ou a permanência de crianças e adolescentes desacompanhados
dos pais ou responsável, fora dos horários e faixas etárias definidas na
regulamentação judicial.
CONSIDERANDO que o descumprimento das disposições da
portaria judicial, a título de dolo ou por simples culpa, importa, em tese, na
prática da infração administrativa tipificada no art. 258, da Lei nº 8.069/90,
sujeitando o proprietário do estabelecimento e/ou responsável pelo evento a uma
multa de 03 (três) a 20 (vinte) salários de referência devidamente corrigidos
para cada criança ou adolescente encontrado irregularmente no local;
CONSIDERANDO que bebidas
alcoólicas são substâncias
manifestamente prejudiciais à saúde física e psíquica, eis que causam
dependência química e podem gerar violência;
CONSIDERANDO que a ingestão de bebidas alcoólicas por
crianças e adolescentes constitui forma de desvirtuamento de sua formação moral
e social, facilitando seu acesso a outros tipos de drogas;
CONSIDERANDO que, em razão disto, é “proibida a venda à criança ou adolescente de bebidas alcoólicas” e
que constitui crime “vender, fornecer,
ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou
adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar
dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida”, nos
termos dos arts. 81, incisos II e III, e 243, ambos da Lei nº 8.069/90;
CONSIDERANDO que, na forma da Lei e da Constituição
Federal, todos têm o dever de colocar as crianças e
adolescentes a salvo de toda forma de negligência, assim como de prevenir a ocorrência de ameaça ou de
violação de seus direitos (cf. art. 227, da Constituição Federal c/c arts. 4º, caput, 5º, 18 e 70, da Lei nº 8.069/90, respectivamente), o que inclui o dever dos proprietários e responsáveis
pelos estabelecimentos onde serão realizados os bailes e eventos de Carnaval
e/ou onde são comercializadas bebidas alcoólicas, bem como seus prepostos, de coibir a venda, o fornecimento e o consumo
de bebidas alcoólicas por crianças e adolescentes nas suas dependências,
ainda que o fornecimento ou a entrega seja efetuada por terceiros;
CONSIDERANDO que, por terem o dever legal de impedir a venda ou o repasse a crianças e
adolescentes, ainda que por terceiros, das bebidas alcoólicas comercializadas
nas dependências de bares, boates e/ou estabelecimentos onde são realizados
bailes e eventos de Carnaval, seus proprietários, responsáveis e/ou prepostos
podem ser responsabilizados administrativa, civil e mesmo criminalmente pelo
ocorrido (nos moldes do disposto no art. 29, do Código Penal), não sendo aceita
a usual “desculpa” de que a venda foi feita originalmente a adultos e que
seriam estes os responsáveis por sua posterior “entrega” à criança ou
adolescente;
CONSIDERANDO, por fim, que é assegurado o livre acesso
dos órgãos de segurança pública, assim como do Conselho Tutelar, representantes
do Ministério Público e do Poder Judiciário, aos locais de diversão (o que
abrange os estabelecimentos onde serão realizados bailes e eventos de Carnaval
abertos ao público), em especial quando da presença de crianças e adolescentes,
constituindo crime “impedir ou embaraçar
a ação de autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do
Ministério Público no exercício de função prevista nesta lei” (cf. Art.
236, da Lei nº 8.069/90);
RESOLVE RECOMENDAR o seguinte:
1 - Que os proprietários ou responsáveis por clubes, boates,
casas noturnas, bares e outros estabelecimentos onde serão realizados bailes e
eventos de Carnaval abertos ao público, com ou sem a cobrança de ingressos,
efetuem por si ou por intermédio de prepostos um rigoroso controle de acesso
aos respectivos locais de diversão, de modo que não seja permitido o ingresso
de crianças e adolescentes desacompanhados dos pais ou responsável legal (tutor
ou guardião), em desacordo com as disposições contidas na Portaria Judicial
expedida para tal finalidade;
2 - Que o controle de acesso seja efetuado mediante
apresentação dos documentos de identidade da criança ou adolescente e de seus
pais ou responsável, bem como, neste último caso, dos respectivos termos de
guarda ou tutela;
3 - Que no caso de falta de documentação ou dúvida quanto à
sua autenticidade, o acesso não deve ser permitido;
4 - Estando a criança ou adolescente com idade inferior à
prevista na Portaria Judicial acompanhada de seus pais ou responsável legal, o
acesso deverá ser permitido, porém deverão ser estes orientados a levar consigo
seus filhos ou pupilos ao saírem, de modo que os mesmos não permaneçam no local
desacompanhados, em violação ao disposto na determinação judicial respectiva;
5 - Que os proprietários ou responsáveis por clubes, boates,
casas noturnas, bares e outros estabelecimentos onde serão realizados bailes e
eventos de Carnaval abertos ao público e/ou onde são comercializadas bebidas
alcoólicas, bem como seus prepostos, se
abstenham de vender, fornecer ou servir bebidas alcoólicas a crianças e
adolescentes, afixando, em local visível ao público, cartazes alertando desta
proibição e mencionando o fato de constituir crime;
6 - Que os proprietários ou responsáveis por clubes, boates,
casas noturnas, bares e outros estabelecimentos onde serão realizados bailes e
eventos de Carnaval abertos ao público e/ou onde são comercializadas bebidas
alcoólicas, bem como seus prepostos, também se empenhem em coibir o
fornecimento de bebidas alcoólicas a crianças e adolescente por terceiros, nas
dependências de seus estabelecimentos, suspendendo de imediato a venda de
bebidas a estes e acionando a Polícia Militar, para sua prisão em flagrante
pela prática do crime tipificado no art. 243, da Lei nº 8.069/90;
7 - Em caso de dúvida quanto à idade da pessoa à qual a
bebida alcoólica estiver sendo vendida ou fornecida, deve ser solicitada a
apresentação de seu documento de identidade, sob pena de incidência do contido
nos itens 5 e 6 desta Recomendação;
8 - Que seja assegurado livre acesso ao Conselho Tutelar,
assim como aos representantes do Ministério Público e do Poder Judiciário e
órgãos de segurança pública aos estabelecimentos onde são realizados bailes e
eventos de Carnaval abertos ao público, com ou sem a cobrança de ingressos,
para fins de fiscalização do efetivo cumprimento das disposições contidas nas
Portarias Judiciais, bem como para evitar e/ou reprimir eventuais infrações que
estiverem sendo praticadas, devendo ser aos mesmos prestada toda colaboração e
auxílio que se fizerem necessários;
9 - Que sejam afixadas em local visível, para orientação e
conhecimento do público, cópias da Portaria Judicial que disciplina o acesso de
crianças e adolescentes desacompanhados dos pais ou responsável legal a seus
estabelecimentos, assim como desta Recomendação Administrativa, sendo também
recomendável, quando da venda de ingressos e/ou distribuição de convites, ainda
que em local diverso, que sejam prestadas as orientações contidas em ambos
documentos, em caráter preventivo.
Se necessário, o
Ministério Público tomará as medidas judiciais cabíveis para assegurar o fiel
cumprimento da presente Recomendação, sem prejuízo da apuração de eventual
responsabilidade daqueles cuja ação ou omissão resultar na violação dos
direitos de crianças e adolescentes tutelados pela Lei nº 8.069/90, ex vi do
disposto nos arts. 5º, 208, caput e par. único, 212, 213, 243 e 258,
todos da Lei nº 8.069/90.
Expeçam-se cópias da
presente Recomendação aos Destacamentos da Polícia Militar e às Delegacias de
Polícia Civil, aos Conselhos Tutelares e aos Prefeitos Municipais de Acari e
Carnaúba dos Dantas, devendo os citados gestores promoverem ampla publicidade
deste instrumento, encaminhando-se também cópia aos principais blogs das
duas cidades.
Acari/RN,
26 de fevereiro de 2014.
Marília
Regina Soares Cunha
Promotora de Justiça
em Substituição Legal