11 de maio de 2010

UMA LUTA QUE TERMINA DE FORMA TRISTE

Em pleno Dia das Mães, a dona de casa Ana Cláudia de Souza, 32 anos, recebeu uma notícia fatídica. As filhas caçulas, as gêmeas siamesas Ruth e Raquel, morreram no último domingo, no final da tarde. Elas foram veladas e sepultadas na tarde de ontem no cemitério do Bom Pastor 2. As gêmeas nasceram no dia 2 de maio - unidas pelo toráx - e estavam internadas na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Santa Catarina, Zona Norte, desde o nascimento. Elas respiravam através de aparelhos e tinham pressão arterial instável. De acordo com exames realizados pela equipe médica do hospital, a causa da morte foi uma parada cardiorespiratória irreversível. Ruth e Raquel dividiam o mesmo fígado, mas tinham dois corações e dois cérebros.


Ruth e Raquel dividiam um mesmo fígado e tinham corações interligados Foto: Carlos Santos/DN/D.A Press
O pai das meninas está indignado, porque afirma que pediu para que o hospital realizasse uma cirurgia de separação, opção que foi descartada. A direção alega que a cirurgia resultaria necessariamente na morte de uma das meninas, e que não poderia escolher quem viveria e quem morreria. O presidente do Conselho Regional de Medicina do RN e um especialista em Direito Médico apoiaram a decisão (veja matéria abaixo).

A direção técnica do hospital também alegou que provavelmente as duas não iriam sobreviver. O diretor técnico do Santa Catarina, Damião Nobre, esclareceu que as gêmeas nasceram com uma série de defeitos congênitos, entre eles uma onfalocele, quando órgãos se desenvolvem na parte externa do corpo. Na prática, o bebê nasce com um saco que se exterioriza através do defeito e contém o intestino delgado, o fígado e o intestino grosso.

Ana Cláudia lembra que sentiu uma dor no peito antes de receber a notícia Foto: Carlos Santos/DN/D.A Press
O nascimento de gêmeos siameses é raro. Estima-se que de cada 100 mil nascimentos, apenas um seja de siameses. O caso de Ruth e Raquel é apenas o terceiro registrado nos últimos 20 anos em Natal.

O defeito foi identificado aos oito meses de gestação. Ana Cláudia, que é mãe de mais quatro crianças, não teve acompanhamento médico durante a gravidez. Só aosoito meses, resolveu fazer uma ultrassonografia e foi informada da situação. "Quando a médica viu que eram gêmeas e estavam coladas, eu senti que elas não iam sobreviver", relata Ana Claúdia. Com o resultado do exame em mãos, foi encaminhada para uma maternidade em Natal. A gestação foi considerada de alto risco. Ela passou por duas maternidades e um hospital geral, onde deu à luz. As meninas foram internadas na UTI do Santa Catarina e Ana Cláudia foi para casa.

No domingo, ela sentiu uma dor forte no peito e não conseguiu controlar o choro. "Toda mãe sente quando o filho morre". Minutos depois, um médico ligou dando a notícia. "Perdi minhas filhas no Dia das Mães. Queria elas perto de mim, mas não tem como. Fico triste, pensando. Não posso fazer mais nada. Elas já morreram mesmo", lamenta a mulher já sem nenhuma lágrima para chorar.

Acusação

O pai das crianças, Carlos Antônio da Silva, 42, acusou o hospital de negligência pelo fato de não ter tentado separar as meninas e salvá-las. O diretor técnico do hospital, Damião Nobre, disse que "elas morreram porque iam morrer de qualquer maneira". Ele chamou as crianças de "inviáveis", alegando que não seria possível separá-las.

Damião se disse surpreso com a sobrevida das meninas, que permaneceram internadas na UTI. "A gente achou que não iam passar de 24 horas. Nosso objetivo era apenas salvar a mãe, porque sabíamos que as meninas não iam sobreviver". Damião afirmou que as gêmeas siamesas não tinham condição de sobrevivência, porque possuiam dois corações interligados e apenas um fígado. Para separá-las sem maiores complicações, cada menina precisaria ter o próprio fígado. Em caso de uma cirurgia de separação, hipótese levantada pelos pais das gêmeas, uma delas ia acabar morrendo, de acordo com o diretor técnico. Ele disse que a equipe médica não podia simplesmente escolher quem seria salva. "Nós não poderíamos tentar separá-las, porque salvar uma era assassinar outra", justificou o diretor técnico do hospital.

Saiba mais

Gêmeos siameses são idênticos e unidos, geralmente pelos quadris, peito, ou cabeça, e geralmente compartilham alguns órgãos. Quando são relativamente normais, são chamados de gêmeos simétricos. Quando uma criança é subdesenvolvida e dependente da outra, são chamados de assimétricos. Geralmente, os "parasitas" (dependentes) são removidos cirurgicamente para que o sadio sobreviva.

Separações bem sucedidas de gêmeos simétricos têm sido realizadas, mas raramente têm se feito tentativas quando existe compartilhamento de órgãos vitais. Esse tipo de nascimento ocorre quando um par de gêmeos univitelinos não consegue se separar. Os gêmeos idênticos nascem de um mesmo óvulo que, logo depois de fecundado se divide. Em casos raros, essa separação não dá certo e os óvulos ficam unidos. Eles continuam a se desenvolver, mas quando ficam "prontos", os bebês nascem unidos.

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