29 de abril de 2010

A CAVALGADA NOS SERTÕES DO ACAUÃ


Os bravos sertanejos começaram a cruzar o território no lombo de cavalo, tais colonizadores conduziam sua boiada e fincava suas caiçaras ou currais próximos às margens do rio. Para se ter controle do rebanho o sertanejo juntava seus familiares e amigos em busca do gado que se multiplicava de tal forma merecendo o reconhecimento do rebanho (apartação). Eram bichos do mato que viviam sem ferro e sinal, sem dono e sem marca. Dia ou noite o cavalo é capaz de resistir a todas as privações, a todos os serviços pesados e a todos os esforços. E’ a ferramenta básica do vaqueiro, do montador, do homem sertanejo. Assim o cavalo, na lida do dia-a-dia arranca ou espirra muito adentro da caatinga espinhosa, veredas estreitas com fortes cipós, desce o descambar dos serrotes, rompendo a mata fechada, os escorregões nas trincheiras de pedras, sem hesitações, sem temor e sem cansaço. Não se faz necessário o uso de ferraduras para enfrentar os terrenos difíceis, o cavalo acostumado, adapta-se ao terreno árido e seco que só na caatinga existe. Raramente fica estropiado. O cavalo do sertão brilha os olhos quando sente o açoite da ligeira. Com resistência e sobriedade os cavalos, os burros-mulos e jumentos são preparados para a cavalgada. Ao amanhecer, a tropa reunida prepara cada animal com mansidão e zelo, coloca a sela e os arreios para o animal ficar pronto para mais um dia de esforço. No momento do café, chegamos a Fazenda Manoel Antonio; um imponente casario dos herdeiros de Manoel Bezerra Galvão (Neco de Hemetério) onde todos degustaram os deliciosos pratos da culinária sertaneja. Desde o cuscuz temperado, a tapioca com ovo, os bolos, o leite quente, a coalhada, o tradicional chá, a imbuzada ao complemento do prato com a variedade de frutas. Após o café reforçado, o grupo sai com destino determinado para ir e voltar. O guia conduz a bandeira simbolizando a chegada dos cavaleiros nas fazendas que passam. Em cada lugar uma prosa se prolonga, aquela conversa de amigos relembrando os feitos de grandes vaqueiros que fizeram do laço sua marca maior para as futuras gerações. Como se trata de um passeio, diversão e lazer todo percurso é motivo de surpresa. Passamos por vaquejadores estreitos, leitos de riachos, de porteira em porteira fechamos a tramela, nos lugares mais férteis aquela cavalgada uns querendo chegar primeiro que o outro. Ao longo de todo o percurso, surgem conversas imaginárias, prosas sem rima e sem verso, o grito ecoa nas serras quando muitos fazem da arte do aboio seu consolo lembrando-se de tantos outros vaqueiros. Nos caminhos estreitos vários trançados deixados pelas pegadas do gado no pasto. Muitos dos cavaleiros faziam o percurso isolado, vislumbrando a paisagem sertaneja com o olhar voltado para a beleza que a natureza proporciona. É’ a CAVALGADA DA RIBEIRA DA ACAUÃ quando se percorre várias fazendas de gado criadas há séculos, onde a casa da fazenda é o sinal de que muitos fizeram no passado a construção de nossa história. Ao chegarmos à casa grande da Fazenda Rajada o anfitrião Carlos de Assis e familiares receberam o grupo oferecendo o melhor que o sertanejo sabe fazer; sua hospitalidade que é expressa com aquele almoço. Na mesa farta se serve uma variedade de comidas típicas da culinária regional; como a feijoada, arroz ao leite, batata-doce, farofa, carne de bode ou carneiro, galinha caipira torrada e o pirão do caldo de mocotó, guisado de costela e a paçoca dão um sabor predileto. Para sobremesa, os doces caseiros são oferecidos com as delícias do queijo do sertão ou coalho, a rapadura não pode faltar; é a mesa de todos. No alpendre ou sob a sombra do tamarineiro a maioria dos cavaleiros se espalha procurando o melhor lugar para saborear o diversificado cardápio. Ao entardecer, na volta para a cidade aquele impulso toma conta de cada cavaleiro. As mulheres saem na frente abrindo o caminho com sua beleza inconfundível. Deixamos pegadas na parede do velho açude, nos currais da vacaria e no leito do rio durante nossa passagem. Um encantamento é provocado com a chegada da chuva e, muitos tomados pela euforia gritavam e lançavam seus provérbios. Saberes e conhecimentos passados de pai para filho que marcam o dia-a-dia do sertanejo. Cada um com sua peleja e pensamento imediato, surgindo cada dizer que jamais se imaginara existir. Tantos e tantos, que gravamos alguns: “Antes burro que me leve que cavalo que me derrube”, “cavalo que não dá pra sela, bota-se na cangalha”, “certo que só cangalha em besta”, “cavalo velho com cangalha nova, pisadura é certa”, “cavalo de cachaceiro conhece caminho de bodega”, “cresce que nem rabo de cavalo”, “o cavalo conhece a perna de quem monta”. É a tradição sertaneja, a cultura nordestina sendo preservada com a cavalgada nos dias atuais.

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